Por Kadu Santoro
Na narrativa de Gênesis 2.10-14,
encontramos pela primeira vez na Torá, dentro do relato da criação a palavra “nome”
– shem, surgindo em um contexto fluvial, nomeando um rio que desagua em
quatro afluentes, lembrando que o elemento água dentro da Cabala está
diretamente associado ao espírito por ser um elemento mais sutil e menos denso
que a matéria como a conhecemos.
O nome Éden tem sua origem no acadiano
edinnu, que provém da palavra suméria edin, que significa
“planície” ou “estepe”, que se encontra relacionada a uma palavra aramaica que
significa “frutífera” ou “bem regada”. Ainda tem alguns exegetas (Bíblia de
Douay-Rheims) que associam esse nome com uma palavra hebraica que significa
“prazer”, ficando o texto da seguinte maneira: “e o Senhor Deus havia plantado
um paraíso de prazer”, ao invés de “um jardim no Éden.” Assim também foi
chamado o enigmático trípico de Hieronymus Bosch – O Jardim das Delícias” –
1510.
Observe bem que a narrativa bíblica
faz uma distinção entre o Jardim e o Éden (Gan Éden – Paraíso - Nd( Ng), uma vez que o rio sai do Éden para irrigar o Jardim. Os
afluentes são chamados de “cabeças” – rashim. A guematria cabalística da
palavra Éden é 9 – ( Ayin = 70 + Dalet = 4 + Num Final = 700 = 774 = 18 = 9 )
Iessód, o Fundamento, o arquétipo da vagina, por onde nascemos vindo das águas,
ou seja, o Éden corresponde a origem da vida em Malchut.
“E um rio saía do Éden, para regar o
jardim; e dali se espalhava e convertia-se em quatro cabeceiras. O nome de um
(shem ha echad) (é) Pishón, o que rodeia toda a terra de Chavilá, que ali se
acha o ouro. E o ouro daquela terra é bom: ali se acha o cristal e a pedra de
ônix. E o nome do segundo rio (é) Guichón, o que rodeia toda a terra de Cush
[Etiópia]. E o nome do terceiro rio (é) Chidékel [Tigre], o que corre ao
Oriente da Assíria [Ashur]. E o quarto rio é Perat [Eufrates].” Gênesis
2.10-14 – Versão Torá Sêfer.
Agora vamos analisar cabalisticamente
o que representa esses quatro afluentes que procedem do Éden. O primeiro rio se
chama PISHÓN - Nw#yp, e sua
guematria é a seguinte: Pei = 80 + Yud = 10 + Shin = 300 + Vav = 6 + Num Final
= 700 = 1096 = 16 = 7. O segundo rio se chama GUICHÓN - Nwxyg, e a sua guematria: Guimel = 3 + Yud
= 10 + Chet = 8 + Vav = 6 + Num Final = 700 = 727 = 16 = 7. O terceiro rio se
chama CHIDÉKEL - lqdx (Tigre) e
sua guematria é: Chet = 8 + Dalet = 4 + Kuf = 100 + Lamed = 30 = 142 = 7. O
quarto e último é PERAT - trp (Eufrates)
e sua guematria é: Pei = 80 + Resh = 200 + Tav = 400 = 680 = 14 = 5.
Observe que o primeiro rio é chamado
de “rio um” (naar há echad) e não “primeiro rio” (naar ha rishone), estando
assim dentro da lógica de raciocínio do hebraico, talvez em função para nos
dizer que, mesmo que haja uma “hierarquia” entre esses quatro rios, o primeiro
não seria necessariamente o primeiro a ser mencionado, assim como a letra Álef,
a primeira do alfabeto hebraico, que é sagrada e por isso dá lugar a letra Bet
para início do alfabeto, e por isso o alfabeto é chamado Álef-Bet.
Um segredo revelador!!! Repare que no
enunciado dos quatro rios, somente os três primeiros tem a palavra “nome” – shem.
O quarto rio, apesar de ter um nome, não é precedido pela expressão “o nome do
quarto rio...”, porque???
Temos várias pistas para essa
resposta. Perceba que a guematria dos três primeiros rios dá 21, ou seja, cada
um dos três rios dá 7 – Nêtsarch – Vitória. A guematria do quarto rio dá 5 –
Guevurá – Justiça. Temos três rios dando 7 cada um, e um rio dando 5. Segundo
os cabalistas, eles veem nesses quatro rios uma alusão/alegoria aos quatro
níveis de interpretação das Sagradas Escrituras, o PARDES, que significa
“pomar” ou “paraíso”: PeSHaT = Sentido simples, literal; ReMeTZ = Insinuação,
alusão, alegórico; DeRaSH = interpretação e SoD = Sentido secreto, oculto,
místico.
Logo, perceba que os três primeiros
níveis (rios) são iguais no sentido da abordagem racional, e o quarto nível, o
SOD, é o nível transcendente, espiritual e secreto, o nível em que a Cabala
opera. Podemos fazer essa associação no Novo Testamento, entre os quatro
Evangelhos, onde os três primeiros: Mateus, Marcos e Lucas, chamados de
sinóticos (semelhantes e históricos), enquanto o quarto Evangelho, o de João, o
Evangelho mais elevado e espiritual, aquele que conduz o leitor aos mistérios
do Apocalipse, também chamado esotericamente de a Chave de David, que é o nível
de SOD, segredo.
Outro segredo importante, é que a soma
da guematria cabalística dos quatro rios, dá exatamente o número do Nome
Sagrado – o Tetragrammaton, 26, ou seja, 7 + 7 + 7 + 5 = 26. O resultado
guemátrico dos quatro rios é o valor do Nome Sagrado – hwhy.
Ainda temos uma análise profunda na
visão hindu, onde essas quatro rios, representam as quatro correntes de energia
vital na coluna, segundo a teoria dos chakras: Sushuma, Vajra, Chitra e
Brahmanadi, e ainda, os Sufis, a Tradição Esotérica do Islã, ensina que os
quatro rios do Paraíso referem-se aos quatro canais nervosos sutis no corpo
humano, que o praticante é
instruído a ativá-los de diversas maneiras, entre elas, através das
danças/movimentos sagrados dos Dervixes.
Para encerrar, a Água da Vida estudada
acima, consiste em uma corrente de energia fluídica real que percorre pelo
corpo humano e pelo cérebro nos estados superiores de consciência. Essa Água da
Vida possui outros nomes em outras culturas como Ambrosia, Amrita, Soma e até
de Néctar da Imortalidade (Epopeia de Gilgamesh). A água é a metáfora
convencional para o fluxo das correntes de energia vital, simplesmente porque “a
verdadeira sensação de transmissão de energia é como água corrente, como uma
força que percorre o corpo do agente de cura.” Rosalyn Bruyere, Wheels of
Light.
Já que sabemos que água está associado
com espírito, consciência, também podemos associar esses quatro rios aos quatro
mundos ou níveis conscienciais da Árvore da Vida: Atsilut – Mundo da Emanação;
Briá – Mundo da Criação; Ietsirá – Mundo da Formação e Assiá – Mundo da Ação.
Paz Profunda.
Nenhum comentário:
Postar um comentário