quinta-feira, 27 de outubro de 2016

A importância esquecida dos gnósticos no contexto do cristianismo

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Por Kadu Santoro
Tratar de um tema como os gnósticos não é uma tarefa fácil, até porque a religião dominante sempre atacou ferozmente suas tradições, essas da qual ela mesma bebeu da fonte e utilizou de elementos para a formação da religião imperialista, como disse certa vez o Padre e Teólogo Alfred Loisy: “Jesus anunciou o Reino, mas quem veio foi a Igreja”. Começamos esse assunto lembrando que durante os primeiros séculos após o acontecimento Jesuânico, o cristianismo ainda não existia formalizado como o conhecemos hoje em dia. Diversos grupos com crenças bem distintas oriundas de diversas partes do oriente médio e mediterrâneo, inspirados pela história de Jesus começaram a se organizar. O cristianismo que imperou e sobreviveu até os nossos dias descende das ideias de um desses grupos da época, porém, os que deixaram de existir devido às perseguições possuíam ideias muito interessantes e avançadas, como o conceito da deificação do homem através do próprio homem chegando a união mística com o Uno, comprometendo seriamente a classe sacerdotal dominante com a institucionalização da Igreja. Entre esses grupos, os gnósticos se destacavam fortemente através dos seus curiosos ritos, suas divindades alternativas e suas complexas cosmogonias e teosofias.
Entre os diversos grupos da época, com certeza, os gnósticos de Alexandria foram os que se destacaram mais e tiveram grande importância no cenário do cristianismo nascente. Grande parte (embora pouco perto do que foi destruído) da sabedoria oculta ocidental que temos acesso hoje, vem da idade média e do período do renascentismo, pois foi nesse período que os pesquisadores da época se debruçaram nos tratados antigos em grego e hebraico, nos provando que foram os gnósticos os precursores de diversos conhecimentos avançados que encontram-se presentes até os nossos dias.
Os gnósticos eram, de certa forma, seguidores do movimento cristão, mas de forma mais sincrética, misturando em suas crenças elementos e práticas oriundos dos gregos, egípcios e do oriente próximo. E devido a isso foram capazes de sistematizar doutrinas como a Cabala e a Alquimia, que vieram ressurgir na Europa cristianizada séculos depois.
Muitos dos conceitos estabelecidos pelos gnósticos, derivam de culturas e tradições remotas, muito antigas, e muitas de suas crenças não são ainda hoje bem compreendidas, pois apesar do pouco material que sobreviveu devido às perseguições pelos cristãos imperialistas (lembrando do incêndio da Biblioteca de Alexandria), graças a algumas “ordens secretas” (incluindo o monasticismo do deserto) esses conhecimentos foram preservados, e ainda hoje, o seu conteúdo é fortemente ameaçador para o modelo cristão imperialista dominante, pois tem como centro, a divinização do homem, não tendo mais importância alguma a participação do sacerdócio e muito menos da institucionalidade da Igreja no processo salvífico, pois como diz nos Evangelhos, o véu do templo (santo dos santos – Véu de Ísis) foi rasgado de cima para baixo, logo, o acesso ao Uno está aberto para aquele que busca a ascese espiritual e união a união mística.
A igreja Católica Apostólica Romana, prega um cristianismo meramente contemplativo e devocional enquanto o protestantismo prega um cristianismo pragmático utilitarista baseado na antiga teologia da retribuição, ao contrário do cristianismo gnóstico, que embora também praticassem a contemplação, também experimentavam uma religiosidade intensamente prática com muitos ritos, símbolos, transes e magia, que para eles eram ferramentas para a ascensão espiritual. Além disso, eles realizavam frequentemente atos magísticos cerimoniais, entre eles pode-se listar a conjuração de familiares, utilização de alucinógenos alteradores da consciência e até ritos com os mortos, nos moldes do Livro dos Mortos do Egito Antigo (Lembrando que nos ofícios fúnebres de um Papa, esses ritos são fechados e realizados no subsolo da Basílica de São Pedro no Vaticano até hoje).
Após essas informações, podemos perceber que com tamanho conhecimento libertador nas mãos do praticante comum, nenhuma igreja, seita ou ordem religiosa é capaz de manter o domínio social sobre o povo, e essa é sem dúvida a razão para a Igreja que temos hoje ser como é, pois conhecimento é poder, e esse fica como diz um axioma hermético: “Os lábios da sabedoria estão cerrados exceto aos ouvidos do entendimento.”
Os gnósticos não reverenciavam Jesus de forma fanática e devocional como é feito hoje em dia por católicos e protestantes, até porque eles reverenciavam o Cristo como um espírito benigno enviado à Terra por Abraxas (sua divindade maior) para libertar a humanidade através da Gnose e a Sophia (conhecimento e sabedoria). Muitos dos Evangelhos considerados apócrifos, são de origem gnóstica, e nesses textos, a história de Jesus não é tão imaculada quanto se é pregada por aí. Os gnósticos tinham como característica marcante, chocar e subverter os “bons costumes” da época (predominando o modelo estóico), até porque, para eles, o corpo físico era considerado como um cativeiro para a alma, da qual deveria se livrar e ser livre, unindo-se ao Uno. Logo, Abraxas, era a principal divindade dos gnósticos, que eles associaram ao Cristo, porém, Abraxas tem diversos nomes e formas, defende-se que a grafia original seria Abrasax, também utilizada a expressão Aeon, embora a grafia exata pode parecer irrelevante, mas na gematria cabalística associada à palavra é de maior importância. De seu nome deriva a fórmula IAO, o número 418 que é igual a 13 (número do despertar da gnose) e a palavra Abracadabra, ou Abrahadabra. Embora, a expressão Abraxas aparece em diversos amuletos com cabeça de galo, pés de dragão e um chicote nas mãos.

Para encerrar, é de suma importância entendermos sobre os fundamentos e princípios gnósticos para compreendermos muitas lacunas que não foram preenchidas em relação a história e a espiritualidade ocidental, de forma a nos libertarmos de toda forma de poder religioso instituído, crenças humanas, dogmas e superstições através do autoconhecimento, ou seja, como dizia o Oráculo de Delphos: “Conhece-te a Ti mesmo.” Desperte a centelha divina que habita em vós e decrete sua divindade interior.

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