segunda-feira, 10 de janeiro de 2011

Diálogo entre Eliphas Levi e um filósofo


SEGUNDO DIÁLOGO

UM FILÓSOFO e ELIPHAS LEVI


O FILÓSOFO – (Entrando) — Que fazias com aquele energúmeno?
ELIPHAS LEVI — Nada muito bom, creio; teria apreciado poder acalmá-lo, no entanto, só consegui enraivecê-lo ainda mais.
O FILÓSOFO — Também, que tens a fazer com semelhante gente? E porque obstinas em declarar-te ainda católico? Alijas-te de ti os livres pensadores e os católicos te desprezam.
ELIPHAS LEVI — É um mal entendido.
O FILÓSOFO — Do qual és a causa. Porque te obstinas em dizer "cachorro" quando se trata de "gato"?
ELIPHAS LEVI — Não creio ter me permitido semelhantes excentricidades de linguagem; chamo as coisas pelo seu nome, porém tem me acontecido ver cachorros e gatos que se entendem maravilhosamente.
O FILÓSOFO — Isto nada prova em favor de teu sonho que é um acordo impossível entre a religião e a ciência, entre a autoridade dogmática e a liberdade de exame.
ELIPHAS LEVI — Porque impossível?
O FILÓSOFO — Porque a religião é o sonho que quer fazer a lei para a razão; é o absurdo que se impõe com a obstinação da loucura; é o orgulho da ignorância que, para se crer sobrenatural, inventa virtudes contra a natureza; é Alexandre VI posto no lugar de Deus; é a chave do céu colocado nas mãos sangrentas dos inquisidores.
ELIPHAS LEVI — Não, a religião não é nada disso; a religião é a fé, a esperança e a caridade.
O FILÓSOFO — À que chamas fé?
ELIPHAS LEVI — A fé é a afirmação do que deve ser; e, a aspiração confiada no que é bom
esperar...
O FILÓSOFO — Vamos sair das nuvens, se permites. Dizes católico; pois bem, sabes o que é um católico?
ELIPHAS LEVI — Católico quer dizer universal; um católico é aquele que se religa às crenças universais, ou seja, à religião única, cujo fundo encontra-se nos dogmas de todos os povos e de todos os tempos.
O FILÓSOFO — Não senhor, um católico, de acordo com Veuillot, a quem Roma não condena, é aquele que crê que Jesus Cristo é o único Deus e que fala pela boca do Papa.
ELIPHAS LEVI — Deixemos Veuillot e raciocinemos.
O FILÓSOFO — Não, já que falamos de religião, bem sabes que, segundo um padre da Igreja, muito autorizado, o objeto da crença é o absurdo.
ELIPHAS LEVI — O infinito não é absurdo? Entretanto, a ciência está obrigada a acreditar nele. O eterno acercamento de duas linhas que jamais se tocarão, não é por acaso um absurdo?; sem dúvida, a geometria se vê obrigada a admiti-lo. Existem absurdos de duas espécies: uns são senão aparentes e são aqueles que vem de uma falha da nossa inteligência; outros são evidentes: as afirmações contrárias às verdades demonstradas; agora, a religião não nos obriga a aceitar estas últimas.
FILÓSOFO — Não entremos no labirinto de teus mistérios. O dogma emaranhado à gosto de teus teólogos, me daria fáceis possibilidades de controvérsia; porém, estas antigalhas estão abandonadas hoje em dia, que não nos preocupamos mais com elas, nem mesmo para rir. Resumindo, o Cristianismo está superado pelo progresso há tempos; e se queres pôr vinho novo em teu odre velho, perderas o odre e o vinho! Deixa o velho catolicismo morrer em paz; ele não te aceita; és para ele um renegado e um sacrílego; tens o valor de teu livre pensamento e deixa aos mortos sepultar os mortos.
Fazer ridículos esforços para conciliar a civilização moderna é o "syllabus"; e na verdade, que isto deve matar àquilo. Queres conciliar Polichinelo e a Força; porém Polichinelo não quer ouvir falar desta e pensas em enforcar ele mesmo, ao verdugo, não importando os arranhões do gato. Perdoa-me se sou pouco sério; é porque na verdade, tua fé de expedientes e de preconceitos não é séria; ela exagera o absurdo para aumentar seus malabarismos. Pode ser muito bonita, porém isso não é útil à ninguém e se torna muito molesta para ti.
ELIPHAS LEVI — Deixemos de lado meus interesses pessoais, não os tenho e não quero ter outros a não ser os da verdade.
O FILÓSOFO — Pois bem. A verdade, a verdade evidente para qualquer pessoa de boa fé, é que não existe relação universal, e as religiões devoram-se entre si. Todos os sectários afirmam que Deus lhes tem falado, porém, bem sabes que Deus não fala nunca senão que pela boca de seus sacerdotes, que se amaldiçoam uns aos outros e não estarão, de acordo jamais. Queres conservar o dogma e suprimir o sacerdote, porém eles se equilibraram entre si e até se suportam mutuamente.
Deus é o sacerdote do céu, assim como o sacerdote afirma ser Deus na terra. Dispensas ao sacerdote; ele levará seu Deus e te provará que és ateu.
ELIPHAS LEVI — Eu não quero dispensar a ninguém, senão que desejaria iluminar a todos.
O FILÓSOFO — Talvez, até aos sacerdotes?
ELIPHAS LEVI — Sobretudo aos sacerdotes, porque lhes devo a minha primeira educação.
O FILÓSOFO — Não o digas; pois, nota-se bastante. Entre eles é que aprendestes às conciliações jesuíticas e às asserções com segundas intenções.
ELIPHAS LEVI — Eu escrevo sobre ciências ocultas.
O FILÓSOFO — Entendo, e acreditas que tens que ocultar teu pensamento; porém, haveria um meio bem simples para ocultá-lo; seria o de não escrevê-lo.
ELIPHAS LEVI — E de não falar; porém, então eu não teria a vantagem de discutir hoje contigo.
O FILÓSOFO — Eu não discuto as tuas crenças, condeno-as em nome da ciência e do progresso.
ELIPHAS LEVI — Mas como! Até a minha crença em Deus, na imortalidade da alma, na solidariedade entre todos os homens e no espírito da caridade?
O FILÓSOFO — Estas são, talvez, idéias respeitáveis; porém, que não existem e não poderiam existir para a ciência, pois não são nem demonstráveis nem demonstradas.
ELIPHAS LEVI — De forma que, não acreditas em nada?
O FILÓSOFO — Perdoa-me; creio na natureza, na ciência e no progresso.
ELIPHAS LEVI — Tuas crenças, são as minhas; não se trata senão de nos entendermos; e, antes de outra coisa, o que é a natureza para ti?
O FILÓSOFO — Força e matéria.
ELIPHAS LEVI — Como? Sem espírito?
O FILÓSOFO — O espírito é a força diretriz.
ELIPHAS LEVI — Muito bem, não te peço mais; acrescentarei só "evocadora" e teremos encontrado a Deus...
O FILÓSOFO — Deus, sempre Deus! Não posso sentir esta palavra, ela não pertence à ciência.
ELIPHAS LEVI — É verdade, pertence à fé; porém, a ciência não pode prescindir-se dela.
O FILÓSOFO — É o que eu nego.
ELIPHAS LEVI — Sim, sem poder provar a força da tua negação.
O FILÓSOFO — A ti cabe provar, já que afirmas.
ELIPHAS LEVI — Afirmo que a fé existe e que ela está na natureza do homem. Afirmo que a fé é razoável, dado que a ciência está limitada. Afirmo, por fim, que a fé é necessária, porque, como tu, acredito no progresso. Sem a fé, a ciência não leva senão à dúvida absoluta e ao desgosto por todas as coisas. Sem a fé, a vida não é senão um sonho, que terminará, sem o despertar, no nada. Sem a fé, os afetos são vazios, a honra não é mais do que engano, a virtude, mentira; e, a moral, decepção.
Sem a fé, a ciência não é mais do que o despotismo das riquezas; a igualdade é impossível e a fraternidade não existe. "Filósofos do ateísmo, partidários da força cega e da matéria motriz, vós não sois homens de progresso. À um de nossos mestres, no século passado, já fizestes rir; chamava-se Lamatthie e era um dos médicos do rei da Prússia. É triste vos ver malgastar tanto espírito para provar que sois bests." Digo-te senhor, não poderias ser dirigido, pois credes na força inteligente e no progresso. A força inteligente é o espírito e o progresso é a imortalidade.
O FILÓSOFO — Tudo isto não está demonstrado, Porém o que é evidente para ti não o é para mim?
ELIPHAS LEVI — Estendo-te a mão e separemo-nos como bons amigos.
O FILÓSOFO — Adeus, pois!
ELIPHAS LEVI — Sim, à Deus! Pois pretendes não crer em Ele apesar de que o invocas sem pensar.


Fonte: http://mucheroni.hpg.com.br/religiao/96/outros/sabio.htm


Kadu Santoro

3 comentários:

  1. Olá! Estava passeando pela Internet e encontrei seu blog. Muito interessante e com diversos textos para reflexão e estudo. Gostei e pretendo voltar mais vezes. Na oportunidade, convido-o para também conhecer o meu blog, onde uso a arte literária (poemas, acróstico, sonetos, etc.) para falar de valores cristãos.

    www.faroldoreino.blogspot.com

    Considero essa troca muito enriquecedora.

    Até breve!

    Mary Barbeti

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  2. se tais magos antigos e rescentes nao atingiram a iluminação, os ensinamentos nao importam tanto... de que adianta saber magia para riqueza, prazeres mundanos, se nao acharam a propria luz de si mesmos?
    crowley, levi, e outros do passado foram homens que se perderam em seus proprios egos, desejos mundanos etc...
    porque nao entao estudar os homens que atingiram a iluminacao e o contato com o divino ? e nao com seres de baixa consciencia que trabalham para somente satisfacao mundana e egoica? assim como .... sidartha gautama, osho, krishnamurti ...
    Se o serviço nao esta em pró ao amor universal, entao os conhecimentos nao valeram de nada...

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