Por Kadu Santoro
“Porque é segundo tuas palavras que
serás justificado e é segundo tuas palavras que serás condenado.” Mt.12.37
As palavras possuem enorme poder,
através delas podemos edificar ou destruir, dar vida ou matar, alienar ou
libertar, por isso, faz-se necessário antes refletirmos muito no que vamos
pronunciar. É nesse exato momento de reflexão que o silêncio tem importância
vital, permitindo que a nossa voz interior não nos deixe cometer equívocos e
consequentemente pronunciamos palavras precipitadas que podem causar graves
danos tanto em nossa vida quanto na do nosso próximo.
O silêncio é mais do que um ato de
sabedoria, é uma disciplina urgente que a humanidade precisa desenvolver.
Muitas vezes não atingimos nossas metas por intermédio do ato de falar. O silêncio,
em grande parte de nossa vida é muito mais representativo e pode nos fazer
atingir nossos objetivos de uma forma mais adequada. Através dele podemos
expressar mais do que muitas palavras sem que isso signifique falta de
capacidade ou conhecimento.
O silêncio sempre foi reverenciado e
cultuado dentro das diversas tradições religiosas do mundo. No cristianismo
monástico o silêncio no qual cada um de nós é convocado a entrar, é o silêncio
eterno de Deus. Este silêncio pode ser encontrado no coração e cultivado através
da disciplina da meditação. Na maioria das religiões espiritualistas, o
silêncio é o caminho para a unidade, é através dele que descobrimos que a vida
exterior e interior estão unificadas. Esse silêncio que precisamos desenvolver
deve estar além de todas as palavras, ideias, pensamentos e imaginação, pois
somente assim podemos sentir paz e liberdade.
A tradição bíblica judaica do Antigo
Testamento nos mostra vários casos onde o silêncio foi fundamental para o êxito
do povo eleito. Uma das grandes virtudes dos descendentes de Benjamim (filho de
Jacó), era saber ficar em silêncio nos momentos certos. O rei Saul, escolhido
como o primeiro rei de Israel, era descendente da tribo de Benjamim. Ele fez
bom uso do silêncio, conforme consta na
Tanach (bíblia hebraica). Quando o profeta Samuel comunicou-lhe que seria
rei, ele não mudou seu comportamento e continuou sendo a mesma pessoa, não lhe
subindo à cabeça o fato de ser o futuro rei, tanto que nem fez questão de
contar a seus familiares.
Durante o período do Purim, em meio ao exílio persa, o povo
de Israel também foi salvo devido ao silêncio da Rainha Ester, que obedecendo à
ordem de Mordechay, não falou ao rei sobre suas origens. Tanto Mordechay quanto
a rainha Ester eram também descendentes da tribo de Benjamim.
Em uma parashá (porção semanal de textos estudados na Torá), fala que após
a tragédia que acarretou a morte de dois filhos de Aarão, este se silenciou,
como relatado na Torá: “Vayomer Moshê El
Aharon hu asher diber Hashem lemor bricovay ecadesh veal pene chol haám ecaved
vaydom Aharon (Vaycrá 10:3) – “E
disse Moisés a Aarão: Isto é o que falou o Eterno dizendo: Por meus escolhidos
me santificarei e perante todo o povo Eu serei glorificado. E calou-se Aarão.”
Segundo a sabedoria judaica, o difícil silêncio de Aarão, nesse momento de dor,
demonstra conformismo e confiança na justiça divina, onde mais tarde esse seria
recompensado com a visita do próprio Todo Poderoso.
Segundo outro sábio israelita, o Maharal de Praga zt”l, em seu livro Dêrech Hachayim, escreve que o poder da
fala é um poder físico (do corpo) e o raciocínio é um poder espiritual. Estes
dois fatores antagônicos não podem trabalhar simultaneamente dentro do
indivíduo. Portanto, o silêncio é essencialmente importante para que possamos
evitar erros e atitudes precipitadas, uma vez que quando falamos, estamos de
certa forma, anulando o raciocínio. Mahatma Gandhi fala o mesmo na seguinte frase:
“Aqueles que têm um grande autocontrole,
ou que estão totalmente absortos no trabalho, falam pouco. Palavra e ação
juntas não andam bem. Repare na natureza: trabalha continuamente, mas em
silêncio.”
Mabel Collins em seu livro Luz no
Caminho, diz: “Do seio do silêncio, que é
a paz, uma voz ressoante se elevará. E esta voz dirá: Faz falta alguma coisa
mais; tu colheste, agora tens que semear. E sabendo que esta voz é o silêncio
mesmo, obedecerás. Tu que és agora um discípulo capaz de manter-te firme, capaz
de ouvir, capaz de ver, capaz de falar, que venceste o desejo e obtiveste o
conhecimento de ti mesmo; tu que viste a tua alma em sua flor e a reconheceste
e que ouviste a voz do silêncio, encaminha-te ao Templo do Senhor e lê o que
ali está escrito para ti.” Analisando esse texto, entendo que ouvir a voz
do silêncio, é compreender que a única direção verdadeira vem do interior, da
intuição, da via do coração; encaminhar-se ao Templo do Saber, é entrar no
estado em que é possível aprender verdadeiramente.
A superioridade do silêncio é
demonstrada por Jesus perante Pilatos: “E,
sendo acusado pelos principais sacerdotes e pelos anciãos, nada respondeu.”
Mt. 27.12. “Jesus não respondeu nem uma
palavra, vindo com isto a admirar-se grandemente o governador.” Mt. 27.14.
Para finalizar, lembro que muitas
vezes, o silêncio fala mais do que muitas palavras, e através dele nos tornamos
mais sensíveis, humildes e misericordiosos. Busque a disciplina do silêncio e
verás como sua vida irá mudar para melhor, passando a ser um indivíduo mais equilibrado
e seguro diante desse mundo conturbado e enloquecido em que vivemos atualmente.
Parabéns pela matéria
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