quinta-feira, 24 de maio de 2018

Até quando?

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Por Kadu Santoro

Até quando iremos continuar nos iludindo, evitando o encontro real conosco. Até quando vamos continuar buscando prazeres e satisfazendo desejos efêmeros, servindo como escravos das corporações, instituições e políticas perversas. Enquanto continuarmos dormindo e sendo conduzidos pelos nossos desejos e vontades, eles, os lá de cima, o 1% da população global continuarão nos manipulando.

Até quando vamos ficar ocupados apenas com partidas de futebol, baladas, churrascos, cervejadas, sexo descontrolado, com passeios em shoppings centers alimentando os desejos por coisas que na maioria das vezes são totalmente desnecessárias. 

Até quando vamos ficar preocupados com as vaidades da aparência, com o status ou com a compra de um novo carro. Até quando vamos viver escravos dos cartões de crédito, das selfies e das redes sociais, dos entretenimentos de massa que são verdadeiros shows de pão e circo, com atrações fúteis e esvaziadas de sentido edificante. 

Até quando vamos continuar preocupados em fazer unhas e cabelos todas as semanas se nem observamos para nós mesmos, colecionar pares de sapatos, gravatas e vestuários em demasia. Até quando vamos continuar acreditando em tudo o que nos é falado, sem passar por um profundo processo de reflexão. 

Até quando vamos continuar obedientes e servis às corporações e aos poderes dominantes do mundo, esses 1% que usufruem de mais de 70% dos recursos deixando um pouco menos de 30% para 7 bilhões de pessoas brigarem entre si, ainda levando em conta que mais de dois bilhões estão morrendo nesse exato momento de fome e totalmente abandonados, carentes de saneamento básico e a mínima infra estrutura para sobrevivência. 

Até quando vamos continuar preocupados com embates políticos entre partidos e ideologias que nunca deram certo a não ser para a turma lá de cima, pois não precisamos de partidos, precisamos de inteiros, pessoas plenas em si e em comunhão com o próximo. Até quando vamos continuar vivendo e ensinando nossos filhos a competir, ao invés de promover o encontro e a partilha entre todos os seres de forma harmônica. 

Até quando vamos continuar brigando uns com os outros sem perceber que isso é uma estratégia de instaurar desarmonia na sociedade para que enquanto isso a turma do 1% possa trabalhar sem ser percebido. Até quando vamos continuar aceitando um sistema educacional que não ensina valores e estimula a criatividade, e o ser a pensar por si, apenas a ser mais um obediente eficiente trabalhando para uma corporação como um verdadeiro robô. 

Até quando vamos continuar sendo envenenados pelas indústrias farmacêuticas, alimentícias e químicas com seus fertilizantes assassinos. Até quando vamos continuar achando que a solução do mundo é dinheiro e poder, enquanto não conhecemos nem 1% do que somos. Até quando vamos continuar discutindo por coisas fúteis enquanto estamos perdendo a grande oportunidade de conversarmos com nós mesmos, procurando entender quem realmente somos e qual o nosso papel aqui nessa existência passageira. 

Até quando vamos continuar buscando incessantemente ter ao invés de ser. Até quando vamos continuar achando que esse é o único mundo possível, o mundo da matéria, ignorando as inúmeras dimensões espalhadas pelo o universo, e que não somos daqui, apenas estamos de passagem. Até quando vamos continuar preferindo a pílula vermelha nos iludindo na matrix, acreditando nas velhas promessas mentirosas dos sacerdotes e políticos, que não passam de verdadeiros exploradores da fé alheia. 

Até quando vamos continuar perdendo tempo narcotizados em frente à tela da televisão ao invés de buscar uma leitura edificante ou simplesmente um encontro a só consigo mesmo através de 10 ou 15 minutos de recolhimento interior, com o único objetivo de estar na Presença do seu Ser Superior. Até quando vamos continuar extremamente ruidosos e trasbordando de tanto entulho emocional ao invés de desentulhar-se e permitir o silêncio restaurador. 

Até quando vamos continuar vivendo sem perceber e contemplar a natureza que nos cerca, nossa mãe e mantenedora. Até quando vamos viver pensando no dia de amanhã se não estamos presente no agora e ainda escravos do passado. Até quando vamos continuar achando que a solução para todos os problemas encontram-se fora, ao invés de perceber que a solução está bem perto de nós, dentro de cada um. Até quando vamos ser iludidos de que estudar, ter um bom emprego e estabilidade financeira é a solução dos problemas, se assim fosse não víamos tanto suicídio e depressão nas classes abastadas. 

Até quando vamos continuar enriquecendo as indústrias de cosméticos acreditando na fórmula da juventude, e que esse corpo nunca irá degradar, pois esse é o ritmo natural da existência, como Buda disse que todo composto é perecível. Até quando vamos achar que estamos no controle das coisas, enquanto não conseguimos nem controlar nossos impulsos e desejos ardentes. Até quando vamos continuar discutindo sobre Deus enquanto devíamos estar buscando experimentá-lo. 

Até quando vamos continuar alimentando apenas a forma e esquecendo-se da essência. Até quando vamos continuar vivendo na ilusão de que algum dia seremos felizes pelo que temos e conquistamos ao invés de saber que a felicidade é um estado de plenitude interior e não uma condição instituída. Acorda humanos! Por mais de dois mil anos continuamos dormindo e sendo manipulados, sabotados por nós mesmos na maioria das vezes, cada vez mais para fora, esquecendo que a verdadeira vida encontra-se dentro de nós, portadores da poeira cósmica desde o início até o agora e em diante.


quarta-feira, 2 de maio de 2018

Uma análise cabalística da alegoria de Noé e o Dilúvio


Por Kadu Santoro

Toda a narrativa bíblica possui múltiplas interpretações, pois foi com esse propósito que ela foi escrita como a chave de todas as coisas e não meramente como explanação de um único mistério limitado hermeneuticamente através dos dogmas. Podemos dar como exemplo, quando estudamos a parte que fala da história de Noé e Sua Arca, estamos lidando com uma alegoria. Muitos mistérios da Bíblia não foram ainda compreendidos pela maioria dos estudantes, e não o serão totalmente até que a mente humana desperte proporções conscienciais mais elevadas.

A Bíblia é um livro codificado e continuará codificado até que o homem, pela purificação de seus corpos e o equilíbrio de sua mente, tenha fornecido à espada do discernimento (Hb. 4:12; Mt.10:34) de seu espírito o poder de cortar o Nó e, para isso, o peregrino precisa despender anos e talvez vidas tentando desatá-lo.

O mais interessante é que a verdadeira obra oculta não é secreta; ninguém está impedido de estudar e dominar às leis da Natureza, mas, até termos nos preparado pelo serviço e pelo altruísmo, seremos incapazes de compreender a grandeza, a pureza e a justiça do Plano Universal.

A Bíblia é um livro secreto pela mesma razão que o estudante nada pode ver além do mundo físico ou nos livros sagrados até que tenha desenvolvido olhos internos (despertar esotérico) para ver e apreciar os mistérios luminosos. Robert G. Ingersoll foi preciso nessa questão quando disse: "Um Deus honrado é a mais nobre obra do homem", pois, enquanto Deus for imutável segundo o conceito que d'Ele fazemos (visão dogmática limitante), Ele também será para nós limitado pelos nossos próprios ideais, e os mistérios nas literaturas sagradas estarão velados aos olhos daquele que só vê com a visão física, como diz o axioma hermético: “os lábios da sabedoria estão fechados, exceto aos ouvidos do entendimento.” (O Caibalion).

Retornando ao livro do Gênesis, que contém a narrativa da Arca e do Dilúvio, expresso nos capítulos 6; 7; 8 e 9, que devem ser lidos pelo buscador antes de continuar a leitura desta explanação.

Em primeiro lugar, consideremos o Dilúvio. Em todas as narrativas sagradas do mundo principalmente em suas cosmogonias, encontramos referência a ele e todas concordam com a época aproximada em que ele teria ocorrido. Estudando as religiões comparadas, certamente vamos nos lembrar da grande inundação que submergiu o que restava do continente Atlante cerca de nove mil anos antes de Cristo. Todas as inundações anteriores cobriram apenas uma parte da terra, e o pesquisador é forçado a procurar em outro lugar pela Grande Inundação ou Olvido de que se fala na Bíblia. Encontramos que a antiga palavra usada para inundação não significa necessariamente água, mas sim olvido ou esquecimento.

Uma das grandes leis da Natureza é a dos ciclos, em outras palavras, a lei de ação e repouso cíclicas. Sabemos ser necessário ao homem dormir todas as noites para se refazer de seus gastos de energia durante o dia. Sabemos que cada doação tem que ser balanceada por um recebimento, é o mesmo que acontece com o universo. Chega em um período em que o mundo precisa “descansar” após cada grande dia de manifestação. A isso se chama a Noite dos Deuses (Noite de Brahma). Nessa ocasião, todos os planetas e sóis retornam ao todo universal. Podemos observar esse processo acontecendo nas grandes nebulosas no céu. É então que Deus, o Criador, cessa de manifestar-se por um período de tempo antes de tornar a enviar globos nos quais deve se processar o desenvolvimento do homem. É quando Noé, representado como o Deus de nosso Sistema Solar, e seus três filhos, representam a tríplice trindade, o Pai, o Filho e o Espírito Santo, e as três forças do universo: ativa, passiva e neutra, flutuam sobre o Olvido, carregando com eles todos os embriões de todas as coisas criadas que foram recolhidas para o Infinito e agora retornarão (Dia de Brahma).

Quando o universo é manifesto novamente, esses seres são levados para os orbes com cujas vibrações estejam afinados. O processo é o mesmo que é usado para o Ego dentro da psicologia, que contém em si todos os átomos sementes dos corpos inferiores. O Ego e a substância espiritual que o reveste constituem a Arca; os três filhos de Noé são os átomos sementes dos corpos inferiores e as esposas são os polos negativos desses átomos. Noé é a mente conforme o princípio hermético: “O Todo é Mente; o Universo é Mental.” A Arca com os átomos sementes flutua nessa matéria mental antes da descida novamente dos átomos na matéria por meio do renascimento.

Sabemos que o espírito é imortal. Os animais que são guiados para dentro da Arca representam a vida de todos os reinos que foi retirada para dentro de Deus e lá permanece até que planos de consciência sejam desenvolvidos para que a vida neles se manifeste.

Logo, a história da Arca é a história do Ego construindo os corpos que, quando completados, vão dar a ele consciência em todos os planos da Natureza. Os três filhos de Noé, como já mencionei, são os três corpos inferiores. Para que o homem funcione em qualquer plano da natureza, ele precisa ter um corpo sintonizado com aquele plano vibracional. A perda de consciência (queda) significa que o veículo que sintoniza o espírito com aquele plano foi retirado. Desde que os três corpos inferiores (Nefesh = Instintivo, Ruach = Emocional e Neshamah = Intelecutal) tenham sido construídos, o Ego sempre tem um veículo de expressão e nunca perde consciência em nenhum plano da natureza. É preciso que morra a multiplicidade de eus a serviço do Ego para que o nosso Eu Superior possa resplandecer.

Os animais da Arca representam assim os vários poderes do homem que são levados com ele vida após vida, na arca viva do próprio ser. A única janela na Arca representa o olho espiritual através do qual o homem superior contempla os corpos abaixo dele (um vislumbre do despertar da consciência).

Quando o mundo, ou seja, os corpos novamente entram no ser, a Arca vai repousar no topo do Monte Ararat. Isto é a cabeça do homem ou o lugar alto no corpo (Kether na Cabala). Lá, no seio frontal, o Ego se assenta e as forças dele, descendo outra vez, habitam o corpo.

Quando a pomba, o mensageiro (Malach), traz o ramo de acácia de volta para o homem superior, então ele sabe que os corpos inferiores retornariam à vida, e que será possível descer da Arca e com eles reiniciar o trabalho. Isso mostra que os altos ideais e as forças animais transmutadas podem novamente ir a todos os lugares da Terra e prosseguir com seu trabalho.

A primeira coisa que Noé fez quando saiu da Arca foi construir um altar para o Senhor e, sobre esse altar ele construiu uma fogueira, e sobre esse altar ele ofereceu sacrifícios a Deus. Cada um de nós que seguir seus passos terá de fazer o mesmo. O altar que ele construiu para Deus foi seu próprio corpo purificado (Mc. 14:58) e, diante Dele, ele e todos os seus filhos fizeram reverência. O fogo sobre o altar foi o fogo espiritual interno (fogo do Espírito Santo, Eráclito, etc.) aceso por Noé por meio de seus atos e pensamentos. O sacrifício (sacro-ofício) por ele feito sobre o altar foi o das paixões e emoções inferiores de sua vida.

Então, o arco-íris surgiu no céu e a aliança foi feita entre Deus e Noé que, por todo o tempo que o arco lá permanecesse, jamais haveria outra inundação. Essa é uma alegoria fantástica, especialmente quando nos lembramos que o arco-íris é formado pelas três cores primárias: o azul do espírito, o amarelo da mente e o vermelho do corpo. Estas são as cores da tríplice trindade do homem: o pai, o Filho e o Espírito Santo. Logo que estes três princípios estejam equilibrados no homem, formando em suas combinações todas as demais cores, nunca mais haverá outro Olvido. Enquanto o coração, a mente e o corpo estão unidos harmoniosamente, tudo vai bem. Mas, se apenas uma dessas cores desaparecer, a escuridão envolverá o Ego em cujo templo foi cometido o erro. O tríplice caminho que leva à Deus é apenas um. Se nós amamos com todo nosso ser (Mc. 12:30) e permitimos que a nossa mente e o nosso corpo sigam sem uso, estamos tirando o nosso arco-íris do céu, logo, sem as sete cores não existe o branco, e predomina as trevas. Se sabemos todas as coisas e não temos amor, nada conquistamos (I Cor. 13:2). Se temos conhecimento e amor, mas nos descuidamos das ações de nossas mãos no  trabalho diário, nada conquistamos.

Nesse arco-íris, vemos o tríplice cordão prateado que, quando se parte, o corpo está morto (Ec. 4:12). A morte é o resultado da cristalização, quando o corpo  torna-se por demais pesado para ser carregado pelo espírito. Então ele é descartado e um outro é adquirido. É o mesmo com os pensamentos e emoções. Eles podem ser elevados e etéreos, embora sempre práticos. Se eles não o são, o arco-íris se quebra e o olvido, provocado pela discórdia e as incertezas, envolve o Ego e torna o percurso da vida insustentável.

Para finalizar, a analogia é a chave mestra capaz de abrir infinitos segredos. Nos mundos  e nos indivíduos, a Natureza age da mesma maneira. Assim como é com os menores, assim é com os maiores conforme a Lei da Correspondência: “O que está em cima é como o que está embaixo, e o que está embaixo é como o que está em cima.” Se desejamos ser aqueles que se elevam acima das inundações do olvido e flutuar sobre o caos na Arca de nossas próprias almas, será necessário, construirmos esta arca como a natureza constrói a grande Arca Cósmica, isto é, pelo despertar da consciência e o aperfeiçoamento dos sempre mais elevados veículos de expressão. Isto é realizado vivendo-se diariamente a vida de serviço às coisas do alto (Cl. 3:2), reflexão e amor, cada um destes na medida certa e, sempre, com o único propósito de manter aceso o fogo do altar do Criador.