sexta-feira, 29 de agosto de 2014

A importância do silêncio e da dimensão contemplativa em nossa vida



Por Kadu Santoro

A ausência do silêncio e da dimensão contemplativa tem sido a causa de tantos distúrbios e convulsões existenciais entre os seres humanos. Estamos vivendo mergulhados em um imenso profundo vazio existencial que parece aumentar mais e mais a cada dia. Nos encontramos atrelados a condicionamentos e ilusões impostos por nossa imersão, desde a infância, dentro de uma cultura individualista e exageradamente apegada ao consumo e ao materialismo.

O resultado de toda essa crise tem levado inúmeros indivíduos a experimentar formas difusas e intensas de desajuste, traduzidas em sentimentos de insatisfação, ansiedade, medo angústia, fragmentação de personalidade, frustração e carência afetiva, às vezes associados à sensações de esgotamento ou mal estar físico, metal e psicológico. Tudo isso tem nos conduzido ao que chamamos “mal do século”, ou depressão, que envolve o indivíduo em uma profunda crise de sentidos, envolvendo tanto a parte fisiológica quanto a espiritual, levando até a perda de vontade de viver e consequentemente à morte.

O grande dilema diante desse quadro caótico, é a falta de conhecimento de Si próprio. O indivíduo atual encontra-se totalmente voltado para o mundo exterior, voltado para a condição do ter, deixando de lado a verdadeira essência do Ser, essa que nos aproxima da divindade em potencial que habita em todos nós e consiste na realidade suprema, a nossa parte imortal, a nossa essência, ao contrário da forma que consiste apenas na nossa aparência física, ilusória e transitória.

Em função de todo esse desequilíbrio que estamos atravessando, é que tem surgido em diversas pessoas uma grande necessidade de aproximação com a presença verdadeira, o nosso Eu Interior, que só é possível acessar através de uma mudança radical de vida e da nossa forma de pensar e agir diante desse mundo conturbado. É preciso em primeiro lugar, despertar a consciência, buscar o silêncio, esvaziar-se, para que assim, possamos abrir espaço para o nosso verdadeiro Ser, para recebermos a Luz Eterna, essa que nos inunda e nos coloca diante do nosso centro interior, diante da realidade suprema, além do mundo sensível das aparências.

Há séculos que dispomos de diversos mecanismos para nos elevarmos ao encontro com a nossa essência verdadeira, entre eles, temos as diversas modalidades de meditações, acesses, orações, técnicas de controle da mente e interagência corporal, além das terapias holísticas e exercícios espirituais encontrados tanto no ocidente quanto no oriente. O melhor disso, é que hoje gozamos da plena liberdade de escolha, basta nos identificarmos com uma dessas linhas e buscarmos viver seus princípios e fundamentos, aplicando em nossas vidas, no nosso dia a dia, sem que haja necessidade de nos tornamos “religiosos”, apenas seres livres para cultivar a espiritualidade de forma integral, tanto na esfera individual quanto coletiva. Todos esses processos nos conduzem há um retorno a nossa dimensão mística, que foi sufocada pela religiosidade positivista do século passado. Como disse o teólogo alemão Karl Rahner em sua obra – Elementos de Espiritualidade na Igreja do Futuro: “O cristão do futuro ou será um místico, ou nada será”.

Depois do primeiro passo, que foi a busca do conhecimento de Si mesmo, do despertar da consciência, e do segundo, onde buscamos uma corrente, método, escola ou modo de vida voltado para a busca do salto quântico, é preciso agora dentro desse processo, buscar atingir a dimensão do silêncio e da contemplação, para que possamos discernir a voz interior do Espírito. Para que isso se dê de forma autêntica, é preciso tomar uma postura de escuta atenta que envolva ao mesmo tempo atenção, confiança e abandono. Somente no silêncio é que podemos atingir um estado de atenção pura, de quietude mental e corporal, pois assim é que vamos descobrir o que é a dimensão contemplativa.

Por muitos séculos, principalmente aqui no ocidente, fomos adestrados para falar muito, ter respostas prontas para tudo, inclusive no meio religioso, onde as teologias sempre ocuparam lugares de destaque, controlando os indivíduos através de medos, dogmas e confissões de fé, sempre doutrinando as pessoas com vãs repetições e longos discursos repletos de sofismas e regras. Geração após geração aprendendo a falar cada vez mais, até nas orações, sempre repletas de muitas palavras rebuscadas, porém, isso só gerou um esgotamento profundo e uma sociedade inserida numa cultura ruidosa, barulhenta que não sabe escutar.

É preciso com certa urgência rever nossos conceitos e valores, enxergarmos com os nossos próprios olhos o mundo que nos cerca, e não ficarmos alheios aos fatos e acontecimentos que a cada dia tornam a humanidade cada vez mais emburrecida e domesticada. Somente através do silêncio é que podemos fazer reflexões profundas, nos tornarmos portadores de sabedoria e conhecimento, esses que nos tornam homens e mulheres livres das amarras da ignorância.

Devemos buscar escutar mais o nosso coração, despertar a nossa vocação mística que há muito tempo foi sufocada pela religiosidade dogmática, silenciarmos a nossa mente racional, deixando que a dimensão contemplativa abra todos os canais de conexão com a divindade, o Uno, de onde provém todos os insights capazes de transformar nossas vidas. Devemos lembrar sempre que todas as respostas estão dentro de nós, basta nos conectarmos com o nosso templo interior, e através do silêncio, deixarmos que a voz interior fale aos nossos corações.

Para entrarmos em comunhão com Deus, é preciso antes nos apresentarmos diante dele em silêncio e estado de contemplação, e depois proceder como Jesus nos ensinou: “...Quando orares, entra em teu aposento interior, fecha a porta e ora ao teu Pai em segredo. E teu Pai, que vê no segredo, te recompensará”. (Mt.6.6) dessa forma vamos estar o conectados a fonte primordial, o Reino como Jesus também nos disse, que encontra-se dentro de nós (Lc.17.21), logo, buscando em primeiro lugar o Reino de Deus, todas as coisas vos serão acrescentadas (Mt.6.33).