segunda-feira, 23 de abril de 2012

Transformando a dor e o sofrimento em oportunidade para despertar




Por Kadu Santoro

Segundo o pensamento budista, “a vida é dor e viver é sofrer”, porém, esse axioma existencial nos abre a mente para muitos questionamentos. Cada um de nós possuímos diversos “dramas de existência”, pois desde o momento em que nascemos, somos bombardeados de informações de todos os tipos e formas, principalmente os “nãos”, ou seja, passamos por um processo de aprendizado doloroso, repleto de negações e proibições, que acabam nos levando a uma alienação quase total da nossa subjetividade, ou seja, do nosso processo de pensar intuitivamente livre do julgo do Ego e da racionalidade.

Como disse Joseph Campbell: “Nós não nascemos humanos, nos tornamos humanos.” Essa expressão nos leva a um entendimento muito amplo e profundo. Logo que nascemos, passamos a ter contato com o mundo físico e sensível, onde vivemos num processo de descobertas através dos sentidos e da linguagem, que nos impulsionam de forma obrigatória a nos relacionar com essas descobertas, fazendo com que nos tornemos seres convencionados e limitados, presos nas grandes do Ego.

Todo esse processo se inicia de forma brusca, desde o momento do nosso nascimento até o processo de assimilação e relacionamento com os sentidos, nos trazem muitas marcas dolorosas, que ao longo da nossa existência vão se cristalizando em traumas, fobias, transtornos emocionais e crises existenciais profundas.

Se pensarmos bem, no momento em que chegamos ao mundo, já nos encontramos com nossos dias contados, ou seja, já começou a contagem regressiva, pois afinal de contas, somos matéria composta, e como diz outra frase budista, “todo composto é perecível”, logo, por sermos constituídos de uma gama de elementos químicos e orgânicos, já passamos a nos decompor a partir do processo de oxidação. O envelhecimento é inevitável, e por fim a morte, que é o processo final e acelerado da nossa decomposição física.

Bem, até agora só falei das dores, mas quero de agora em diante, mostrar como através delas, podemos tirar boas lições e com isso, transformá-las em grandes oportunidades para despertar.

Como já vimos, o ciclo da vida não pode ser modificado nem física ou biologicamente, porém, dentro da nossa mente, que é o nosso universo micro-cósmico podemos transformar qualquer coisa através do pensamento. A nossa mente possui infinitas faculdades, pena que aqui no mundo ocidental, conhecemos e utilizamos muito pouco elas devido a nossa formação empírica cartesiana-aristotélica.

Existe um versículo bíblico muito interessante que nos leva a uma profunda compreensão sobre o nosso pensar: “E não vos conformeis com este século, mas trasnformai-vos pela renovação da vossa mente, para que experimentais qual seja a boa, agradável e perfeita vontade de Deus.” (Rm. 12.2)

A expressão utilizada “não vos conformeis com este século”, demonstra que o homem é um ser secular, fadado a um limite temporal que dura cerca de cem anos, e o fato do não conformismo, está associado a nossa capacidade de transformar através da mente as adversidades e sofrimentos em experiências e entendimento, fazendo com que sejamos libertos de qualquer manifestação negativa. Um verdadeiro processo de renovação dos nossos pensamentos que nos levarão a despertar para uma nova condição psíquica e transcendente, onde daremos lugar a nossa centelha divina que habita em nós de agir subjetivamente e intuitivamente, ou seja, já não vamos viver de forma tão ansiosa e depressiva, pois teremos a plena consciência que “Eu e o Pai somos Um” (Jo.10.30), logo, tudo estará sobre controle, pois na dimensão inconsciente coletiva, todos estão conectados ao Todo Supremo. A tomada dessa consciência nos levará a uma verdadeira ascensão da massa crítica, fazendo com que a humanidade passe a viver de uma forma mais harmônica, consciente e humanizadora. Para concluir, deixo uma frase de Jung que sintetiza toda essa realidade: Sua visão se tornará clara somente quando você olhar para dentro do seu coração. Quem olha para fora, sonha. Quem olha para dentro, desperta.”

Desperte você também!

quarta-feira, 11 de abril de 2012

EVÁGRIO PÔNTICO (345-397) e o sentido da oração


Vida e Pensamento:

Evágrio foi um monge, nascido por volta de 345, originário da Capadócia, em Ibora, no Ponto, e por isso ele é chamado de Pôntico. Passou dezesseis anos de sua vida no deserto do Egito, como anacoreta. Foi discípulo e amigo de São Gregório Nazianzeno. Evágrio conheceu bem cedo os três capadócios: São Basílio, São Gregório de Nissa e São Gregório de Nazianzo, sendo ordenado diácono por este último. Herdeiro dos grandes Padres Alexandrinos, Clemente e Orígenes, ele conduziu uma das grandes correntes da espiritualidade bizantina. Foram seus herdeiros, João Clímaco, Máximo, o Confessor, Simeão o Novo Teólogo, os Hesicastas…
Evágrio foi implicado na condenação do origenismo em 553; alguns acham incômodo citá-lo, no entanto, ele penetra e está presente em toda parte. Para Evágrio a ascenção espiritual consiste em contemplar a Deus em si mesmo, de modo que se vê a Deus como num espelho. O caminho consiste em despojar-se dos pensamentos apaixonados, depois, mesmo dos pensamentos simples, até a completa nudez de imagens e conceitos.
Evágrio morreu por volta de 397, deixando inúmeras obras sobre a oração, a vida monástica e ascética.

Pensamentos De Evágrio Pôntico

«Não imagines possuir a Divindade em ti, quando oras, nem deixes tua inteligência aceitar a marca de uma forma qualquer; mantém-te como imaterial diante do Imaterial e compreenderás».

«Não poderias possuir a oração pura, estando perturbado com coisas materiais e agitado por inquietações contínuas, pois a oração é abandono dos pensamentos»,

«A oração é produto da doçura e da ausência de ira».

«Esforça-te por manter teu intelecto surdo e mudo durante a oração: assim poderás orar».

«Se oras verdadeiramente, sentirás uma grande segurança: os anjos te escoltarão como a Daniel e te iluminarão sobre as razões dos seres».

«Se queres orar como convém não entristeças nenhuma alma; senão, corres em vão».

«Bem-aventurada a inteligência que, no momento da oração, torna-se imaterial e despojada de tudo».

«A oração é uma ascenção da inteligência para Deus».

«A oração é a atividade que convém à dignidade da inteligência; é a aplicação mais admirável e mais completa desta».

«Se és teólogo, vais orar verdadeiramente; e se oras verdadeiramente, és teólogo».

«A salmodia depende da sabedoria multiforme; a oração é o prelúdio do conhecimento imaterial e uniforme».

«Quanto mais perto estiver de Deus, tanto melhor será o homem».

«A oração é fruto da alegria e do reconhecimento».

«Enquanto ainda tens atenção para o que provém do corpo; enquanto tua inteligência considera os atrativos externos, ainda não viste o lugar da oração; estás mesmo longe do caminho abençoado que conduz a ele».

«O corpo tem o pão por alimento; a alma, a virtude; a inteligência, a oração espiritual».

«Na hora de orar, encontrarás o fruto de todo sofrimento aceito com sabedoria».

«Os sentimentos mal orientados atrapalham a oração».

«Feliz o espírito livre de qualquer forma durante a oração».

«O rancor cega a faculdade mestra de quem ora e derrama-lhe trevas sobre as orações».

«Aspira a ver a face do Pai, que está no céu: não procure, por nada deste mundo, perceber forma ou rosto durante a oração».

«Pois, quando em tua oração tiveres conseguido ultrapassar qualquer outra alegria, é que finalmente, em toda verdade, terás encontrado a oração».

«Armado contra a ira, não admitas jamais a cobiça, pois é a cobiça que alimenta a ira, esta por sua vez, turva os olhos da inteligência e destrói assim, o estado de oração».

«A oração é uma conversa da inteligência com Deus: que estado não é, pois, necessário, para essa tensão sem retorno, para ir a seu Senhor e conversar com Ele, sem nenhum intermediário?»

«Mantém-te corajoso e ora com energia; afasta as preocupações e e as reflexões que se apresentarem, pois elas te perturbam e te agitam, debilitando o teu vigor».

«Se queres orar dignamente, renuncia-te a todo instante; se suportas toda sorte de provações, resigna-te sabiamente por amor da oração».

«Não te contentes de orar nas atitudes exeriores, mas leva tua inteligência ao sentimento da oração espiritual, com grande temor».

«Não ores para que tuas vontades se cumpram: elas não concordam necessariamente com a vontade de Deus. Ora, sim, segundo o ensinamento recebido, dizendo: ‘que vossa vontade se cumpra em mim’. Em tudo, pede-lhe que se faça a sua vontade, pois Ele quer o bem e o benefício para tua alma; tu, porém, não é isso necessariamente que procuras».

«A oração sem distração é a intelecção mais alta da inteligência».

«Orando com teus irmãos ou orando só, esforça-te por orar, não por hábito, mas com sentimento».

«Quem ama a Deus conversa incessantemente com Ele, como com um Pai, despojando-se de todo pensamento apaixonado».

«Quem ora em espírito e em verdade, não tira mais das criaturas os louvores que dá ao Criador: é do próprio Deus que ele louva Deus».

«O rancor cega a faculdade mestra de quem ora e derrama-lhe trevas sobre asorações».

«A oração é a exclusão da tristeza e do desalento».


Fonte: http://ecclesia.com.br/biblioteca/sophia/?p=2021