sábado, 30 de julho de 2011

Deus nos livre de um "Brasil evangélico" - Ricardo Gondim



Por Ricardo Gondim

Começo este texto com uns 15 anos de atraso. Eu explico. Nos tempos em que outdoors eram permitidos em São Paulo, alguém pagou uma fortuna para espalhar vários deles, em avenidas, com a mensagem: “São Paulo é do Senhor Jesus. Povo de Deus, declare isso”.

Rumino o recado desde então. Represei qualquer reação, mas hoje, por algum motivo, abriu-se uma fresta em uma comporta de minha alma. Preciso escrever sobre o meu pavor de ver o Brasil tornar-se evangélico. A mensagem subliminar da grande placa, para quem conhece a cultura do movimento, era de que os evangélicos sonham com o dia quando a cidade, o estado, o país se converterem em massa e a terra dos tupiniquins virar num país legitimamente evangélico.

Quando afirmo que o sonho é que impere o movimento evangélico, não me refiro ao cristianismo, mas a esse subgrupo do cristianismo e do protestantismo conhecido como Movimento Evangélico. E a esse movimento não interessa que haja um veloz crescimento entre católicos ou que ortodoxos se alastrem. Para “ser do Senhor Jesus”, o Brasil tem que virar "crente", com a cara dos evangélicos. (acabo de bater três vezes na madeira).

Avanços numéricos de evangélicos em algumas áreas já dão uma boa ideia de como seria desastroso se acontecesse essa tal levedação radical do Brasil.

Imagino uma Genebra brasileira e tremo. Sei de grupos que anseiam por um puritanismo moreno. Mas, como os novos puritanos tratariam Ney Matogrosso, Caetano Veloso, Maria Gadu? Não gosto de pensar no destino de poesias sensuais como “Carinhoso” do Pixinguinha ou “Tatuagem” do Chico. Será que prevaleceriam as paupérrimas poesias do cancioneiro gospel? As rádios tocariam sem parar “Vou buscar o que é meu”, “Rompendo em Fé”?

Uma história minimamente parecida com a dos puritanos provocaria, estou certo, um cerco aos boêmios. Novos Torquemadas seriam implacáveis e perderíamos todo o acervo do Vinicius de Moraes. Quem, entre puritanos, carimbaria a poesia de um ateu como Carlos Drummond de Andrade?

Como ficaria a Universidade em um Brasil dominado por evangélicos? Os chanceleres denominacionais cresceriam, como verdadeiros fiscais, para que se desqualificasse o alucinado Charles Darwin. Facilmente se restabeleceria o criacionismo como disciplina obrigatória em faculdades de medicina, biologia, veterinária. Nietzsche jazeria na categoria dos hereges loucos e Derridá nunca teria uma tradução para o português.

Mozart, Gauguin, Michelangelo, Picasso? No máximo, pesquisados como desajustados para ganharem o rótulo de loucos, pederastas, hereges.

Um Brasil evangélico não teria folclore. Acabaria o Bumba-meu-boi, o Frevo, o Vatapá. As churrascarias não seriam barulhentas. O futebol morreria. Todos seriam proibidos de ir ao estádio ou de ligar a televisão no domingo. E o racha, a famosa pelada, de várzea aconteceria quando?

Um Brasil evangélico significaria que o fisiologismo político prevaleceu; basta uma espiada no histórico de Suas Excelências nas Câmaras, Assembleias e Gabinetes para saber que isso aconteceria.

Um Brasil evangélico significaria o triunfo do “american way of life”, já que muito do que se entende por espiritualidade e moralidade não passa de cópia malfeita da cultura do Norte. Um Brasil evangélico acirraria o preconceito contra a Igreja Católica e viria a criar uma elite religiosa, os ungidos, mais perversa que a dos aiatolás iranianos.

Cada vez que um evangélico critica a Rede Globo eu me flagro a perguntar: Como seria uma emissora liderada por eles? Adianto a resposta: insípida, brega, chata, horrorosa, irritante.

Prefiro, sem pestanejar, textos do Gabriel Garcia Márquez, do Mia Couto, do Victor Hugo, do Fernando Moraes, do João Ubaldo Ribeiro, do Jorge Amado a qualquer livro da série “Deixados para Trás” ou do Max Lucado.

Toda a teocracia se tornará totalitária, toda a tentativa de homogeneizar a cultura, obscurantista e todo o esforço de higienizar os costumes, moralista.

O projeto cristão visa preparar para a vida. Cristo não pretendeu anular os costumes dos povos não-judeus. Daí ele dizer que a fé de um centurião adorador de ídolos era singular; e entre seus criteriosos pares ninguém tinha uma espiritualidade digna de elogio como aquele soldado que cuidou do escravo.

Levar a boa notícia não significa exportar uma cultura, criar um dialeto, forçar uma ética. Evangelizar é anunciar que todos podem continuar a costurar, compor, escrever, brincar, encenar, praticar a justiça e criar meios de solidariedade; Deus não é rival da liberdade humana, mas seu maior incentivador.

Portanto, Deus nos livre de um Brasil evangélico.


Artigo respeitosamente extraído do site
http://www.ricardogondim.com.br

segunda-feira, 25 de julho de 2011

Os fundamentos do novo nascimento segundo Jesus


Por Kadu Santoro

“Jesus respondeu, e disse-lhe: Na verdade, na verdade te digo que aquele que não nascer de novo, não pode ver o reino de Deus.” (Jo.3.3)

Essa passagem do evangelho de João, é alvo de muitas controvérsias religiosas e doutrinárias. Talvez porque muitas pessoas enxergam apenas o sentido literal da mensagem e procuram encaixar dentro de molduras sistemáticas e dogmáticas como por exemplo, na doutrina espírita da reencarnação, deixando de lado o sentido metafórico mais profundo revelado por Jesus. Devemos lembrar que Jesus falava às multidões em forma de parábolas e metáforas, pois a religiosidade da época impedia que as pessoas tivessem acesso e evoluissem culturalmente e no conhecimento das sagradas escrituras, este era restrito aos sacerdotes e escribas apenas.

Quando Jesus se refere a um novo nascimento, não fala de forma alguma que isso aconteceria numa próxima encarnação em outra vida, mas sim, aqui e agora. Jesus queria dizer que tudo aquilo que Nicodemos havia buscado e estudado ao longo de sua vida como Fariseu estava morto, ofuscado pela rigidez e observância da Lei mosaica e de seu coração. Nicodemos tinha que em primeiro lugar, matar seu ego, deslocar a sua centralidade interior egoísta dando lugar a imanência divina em sua vida, era necessário que ele se despojasse do seu status religioso farisaico, buscando uma nova aliança interior dentro de si, só que agora com Deus, passando a viver em um estado de graça e plenitude.

Nascer de novo representa uma mudança radical de vida, não apenas no sentido moral e prático, mas numa dimensão espiritual transcendente, através de um novo sentimento de amor e compaixão. O novo nascimento começa no coração, esse, deve ser lapidado e cheio do Espírito Santo. A partir desse novo nascimento, tudo passa a ficar mais nítido e a ter um novo sentido. Depois desta experiência, não dá mais para tolerar injustiças, maldades, mentiras e qualquer outra forma maligna de comportamento e atitude humanas. Nascer de novo representa o despertar da consciência humana para uma nova dimensão, a dimensão do Reino de Deus, essa que se inicia dentro de nós, partindo para fora e alcançado outras vidas. É o romper de uma criatura transformada, vivendo a plenitude proposta por Jesus, de amor, solidariedade e respeito à vida.

Precisamos fazer essa experiência de renascer todos os dias, passar a não olhar mais para o próximo com um senso de julgamento e de condenação, mas olhar com misericórdia e compaixão, sabendo que não somos perfeitos, mas podemos sim, ajudar as pessoas através da oração e da Palavra de Deus. Uma pessoa renascida espiritualmente se enquadra perfeitamente no mais belo discurso de Jesus, o Sermão da Montanha (Mt.5-7; Lc.6.20-29), onde Ele afirma que todos aqueles que possuem tais sentimentos são bem aventurados, e logo herdarão o Reino de Deus.